segunda-feira, julho 30, 2007

O Direito de Usar as Mãos !

Por Christina Paranhos do Rio Branco.
Há cerca de seis anos escrevi para esta revista uma série de crônicas sobre etiqueta. Em determinado momento, resolvi parar. Achei que esgotara minha inspiração. Agora, Gula me convida a retomar o tema. Aceitei a proposta porque ouvi uma história lisonjeira. A revista me disse que até hoje os leitores solicitam cópias de meus artigos. Pois bem, inicio a nova série republicando um dos mais solicitados. Evidentemente, fiz alterações. Procederei da seguinte maneira: algumas crônicas serão requentadas; outras, inteiramente novas. Neste primeiro artigo, abordarei uma questão sobre a qual as pessoas geralmente têm dúvida. Quando comer com as mãos? Asas de galinha, costelinhas de porco, sopas e caldos costumam ser acepipes deliciosos. Mas, ao mesmo tempo, podem comprometer nossa reputação. Como resistir à tentação de dispensar os talheres e usar as mãos? O provérbio português nos diz: "Asas e costelas, com a mão nelas". Por que renunciar à tentação - e ao prazer - de entornar na boca o bowl do consommé? São perguntas que ouço com freqüência. Na verdade, as soluções envolvem certas regras. Garfo, faca e colher são objetos muito naturais no dia-a-dia moderno. Entretanto, durante centenas de anos, ou seja, até o século XVII, o homem usou as mãos para comer. Evidentemente, há situações em que não cometemos pecado se voltarmos ao velho hábito. Comecemos pelo couvert. O pãozinho nunca dever ser cortado com a faca, e sim partido com as mãos. Aliás, o pratinho onde o colocam merece um parêntese. É muito comum a pessoa se atrapalhar e usar o pratinho à sua direita, ou seja, o do vizinho de mesa. O certo é utilizar o da esquerda. Normalmente, o pão vem acompanhado de manteiga, pâté ou antipasto. Há uma regrinha para cada um. A manteiga deve ser colocada pela pessoa no prato menor. A mesma coisa acontece com o pâté. É mais prático pegar uma porção e deixar no pratinho do que ficar estendendo o braço a toda hora, para buscar os potes colocados no centro da mesa. Outra dúvida comum: o que fazer quando o couvert traz azeitonas ou legumes em tiras? Eis uma ocasião em que dispensamos a cerimônia. O melhor é pegar azeitonas e legumes com as mãos. Já abobrinha, berinjela, pimentão e outros antipasti, tão a gosto dos italianos, merecem tratamento diferente. Como são petiscos que vêm mergulhados em óleo ou molho, devem ser colocados no prato maior e saboreados com garfo e faca.As sopas e os caldos também escondem segredos, que é bom conhecer. Os alimentos líquidos costumam ser apresentados em prato fundo ou taça apropriada. Geralmente possuem duas alças laterais. Muita gente pergunta se se levar a taça à boca fere as boas maneiras. De modo nenhum. Depois das primeiras colheradas, pode-se segurar a taça pelas alças e beber o caldo, como se fosse uma xícara. Já a sopa oferecida no prato exige um pouco mais de atenção. Um dos problemas habituais é o que fazer com aquele restinho que fica no fundo do prato. A etiqueta recomenda pegar o caldo com a colher até onde for possível, evitando o barulho do metal contra a louça. Quando não der mais, deve-se parar, mesmo que ainda reste um pouquinho. Jamais se deve levantar a borda do prato para facilitar o trabalho. Os faqueiros antigos favoreciam essa operação, pois traziam algumas colheres com a ponta rebaixada. Hoje em dia, o melhor mesmo é esquecer aquele restinho - e pronto. As mãos podem e devem ser usadas quando o cardápio inclui ostras. Não se trata de uma operação complicada. Segura-se a concha com a mão esquerda e, com a direita, o garfo especial para descolar o molusco. Quase sempre, traz-se à mesa um recipiente com lavanda, água morna e limão, para que se lavem os dedos. O requinte (que alguns confundem com consommé e, desastradamente, o bebem) deve ser colocado à esquerda do comensal. Uma dica final: se à mesa houver queijos firmes em pedaços, como o emmenthal, o provolone ou o parmigiano, podem ser pegos tranqüilamente com as mãos.
Matéria publicada na edição 130, Agosto 2003 da Revista Gula.
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